
Peço a indulgência de um momento para estar ao teu lado. Concluirei mais tarde os trabalhos que tenho em mãos.Longe da visão do teu rosto, o meu coração não conhece nem quietude nem descanso, e o meu trabalho é como uma infinita fadiga num oceano ilimitado de fadigas. O verão trouxe hoje à minha janela os seus soluços e murmúrios; e as abelhas andam no seu labor de menestréis, pelo reino da alameda em flor. Agora é o momento de estar quieto contigo, face a face, e de cantar a oferenda da vida neste ócio silencioso e transbordante. Quando me ordenas que cante, parece que o meu coração vai estalar de orgulho; e eu olho para o teu rosto e vêm lágrimas aos meus olhos.Tudo o que em minha vida é áspero e dissonante confunde-se numa harmonia única e suave - e a minha adoração solta as asas como um pássaro feliz no seu voo sobre o mar. Sei que gostas do meu cântico. Sei que é só como um cantor que posso estar diante de ti. Com a ponta da asa largamente aberta do meu cântico eu roço os teus pés que nunca esperei poder alcançar. Bêbado da alegria de cantar, esqueço-me de mim mesmo e chamo-te amigo, a ti que és o meu senhor. Não sei como cantas, ó meu mestre! Escuto sempre em silencioso deslumbramento. A luz da tua música ilumina o mundo. O sopro de vida da tua música rompe qualquer obstáculo de pedra - e jorra. O meu coração anseia por juntar-se ao teu cântico, mas a linguagem não se transforma em cântico e, confundido, choro em voz alta. Ah, tu fizeste o meu coração prisioneiro nas malhas sem fim da tua música, ó meu mestre!
Tagore
Gitanjali
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